Jornal ACOMARCA

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Não entenderam Novo Horizonte

Por Erikson Wallas
eriksonnh@hotmail.com

Há mais de um ano eu resolvi pesquisar a história de Novo Horizonte. Sabia que não seria fácil porque as informações estavam dispersas e eu tinha que juntá-las, todas, para montar o grande “quebra-cabeça”. Era um desafio motivado pela angústia de ver os principais personagens da cidade morrendo e as histórias sendo enterradas juntas. Uma iniciativa de registrar o passado se fazia urgente e, como ninguém se prontificava a fazer, eu me senti na obrigação de tomar para mim essa missão e, assim, garantir à posteridade o direito – e o privilégio – de conhecer a trajetória do lugar que estará vivendo.
Não me achei o mais preparado para isso. Os meus vinte e poucos anos me fizeram temer muito. Talvez a falta de experiência me impedisse de entender certas coisas e me privasse de uma “malícia”, que se conquista ao longo da vida e nos permite encaixar melhor as peças do “jogo”. No entanto, o medo de ver a história perdida falou mais alto. Lá fui eu aproveitar férias, feriados e alguns finais de semana para enfrentar os quase 600 km que separam Novo Horizonte de Salvador e ir a campo.
Conversei com muita gente. Foram tantas as entrevistas que nem sei ao certo o número exato. Algumas eu gravei, outras anotei em bloquinhos e umas outras guardei na memória, normalmente porque aconteciam inesperadamente, na rua. Eu já estava virando um chato porque queria saber de todo mundo quais as lembranças que tinha da cidade de antes. Vivenciei experiências incríveis, revisitei alguns povoados, fiz amizade com quem eu era apenas conhecido, ganhei lições de vida importantes e o essencial: consegui juntar um material de pesquisa riquíssimo.
 Como o fim do meu curso estava próximo, pensei em transformar o meu desejo de documentar aquela história em um projeto acadêmico, que eu pudesse apresentar na faculdade. Seria, também, uma maneira de mostrar Novo Horizonte para os meus colegas e professores e divulgar o município. Imaginando que aquela era a iniciativa mais genial do mundo, apresentei um pré-projeto que foi aceito. Como fui inocente! A tal da malícia me fez falta foi nesse momento.
A pesquisa que durou mais de um ano virou um livro-reportagem (uma reportagem grande e aprofundada) com mais de 160 páginas, incluindo anexo com fotografias e documentos. Além disso, entreguei um memorial descritivo (equivalente a uma monografia) com mais de 70 páginas, que explicava como se deu o processo de produção, a partir de autores que serviram de base para entender questões ligadas à emancipação de municípios e ao livro-reportagem.
Os seis meses anteriores à entrega do trabalho foram de correria intensa e de uma dedicação total que talvez eu nunca tenha tido por nenhum outro projeto. Esqueci de festas, de diversão, de tudo. O foco era apenas naquele que era o meu presente para a minha terra tão amada. Preciso dizer que nutro um amor incondicional por Novo Horizonte que às vezes nem eu mesmo entendo. Quem sabe porque eu nasci em um momento importante para a cidade, que marca a conquista da tão sonhada independência de Ibitiara, e cresci diante de uma euforia, de um entusiasmo, de uma autoestima, que tornavam a população apaixonada pela sua história.
Levei todo o meu sentimento para o trabalho, mas com a responsabilidade de contar sempre o “outro lado”, as coisas ruins, os episódios que ninguém quer se lembrar. A apresentação foi marcada para o início de julho e eu tinha muita expectativa. Quando o dia da defesa finalmente chegou, eu entendi o quanto eu tinha sido inocente em levar a proposta para a faculdade. Como é que eu apresento para pessoas que não conhecem Novo Horizonte, tampouco a sua história, um trabalho sobre o município? Era óbvio que a avaliação seria feita a partir do que elas “acham” que seja verdade.
Pela primeira vez na vida, desde que comecei a estudar, aos cinco anos, eu fui reprovado. Os avaliadores argumentaram que eu fui “tendencioso” porque aquela era uma visão de quem está dentro da cidade, de quem “tem motivos para defender”. Além disso, eles derrubaram o meu principal argumento, de que a emancipação foi boa para Novo Horizonte. Disseram que não, que se um município não tem nem um hospital – algo que cito no livro-reportagem como uma necessidade -, a separação do território não pode ter sido boa. Como não, se até as pessoas contrárias à emancipação que eu entrevistei se disseram arrependidas porque hoje reconhecem que a autonomia político-administrativa elevou consideravelmente o nível da cidade?
Qualquer um que conhece Novo Horizonte e viveu a sua transição de distrito para município sabe que os avaliadores estavam errados. Mas eu não quis brigar. Desde sempre, aprendi que enfrentar professor é sempre uma luta perdida. Assumi a perda com a cabeça erguida e com a consciência de ter me esforçado e me dedicado para produzir algo imparcial e de qualidade, da forma como merecem meus conterrâneos. A consciência, aliás, foi o que me salvou de toda tristeza e decepção de ter visto jogarem um balde de água fria no projeto que era, antes de tudo, um projeto de vida. Sei que o meu povo está do meu lado e concorda com a minha argumentação e é isso que me importa, agora.
Decidi contar esse episódio aqui para que uma satisfação fosse dada a todos aqueles que acreditaram e me ajudaram na concepção do trabalho. Quero dizer que o desejo e o projeto não morreram com a decisão da faculdade. Vou colocá-los um pouco na gaveta, apenas e, em breve, volto a corrigir e reescrever algumas coisas, antes de tentar a publicação do livro, que não há previsão de acontecer. De qualquer modo, me coloco à disposição de quem deseja ter acesso ao material que juntei. São fotos, documentos e entrevistas que recontam a nossa história e que concretizam o meu maior objetivo: ter o passado documentado, registrado e guardado a sete chaves.
Sendo assim, missão cumprida!

Um comentário:

  1. Esta ai a maior prova que vc poderia dar, o primeiro passo de quem quer um novo horizonte...
    Parabens

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